Realizou-se, no passado dia 30 de setembro, a quarta sessão do ciclo de eventos Energia em Debate dedicada ao tema “Transição Energética e Geopolítica”, (video no link) uma iniciativa dos Future Energy Leaders Portugal, realizada com o apoio da Associação Portuguesa da Energia. Os oradores convidados, Vasco Ferreira, Coordenador de política da União Europeia, Teresa Ponce Leão, Presidente do LNEG e Jorge Moreira da Silva, Diretor da OECD, foram unanimes quanto à necessidade de aumentar a cooperação entre países e regiões para materializar a ambição de uma transição energética segura, justa e sustentável.
Na sua intervenção Vasco Ferreira começou por reforçar a ambição da Comissão Europeia em concretizar o pacto ecológico europeu para a área da energia e do clima, que permitirá à Europa atingir a neutralidade carbónica em 2050. Destacou que as medidas propostas no pacto proporcionam uma oportunidade única para a Europa liderar a transição energética e permitem ao sector industrial europeu evoluir impactando em toda a cadeia de valor do sector da energia, dos transportes e da construção, prevendo a renovação de aproximadamente 35 milhões de edifícios e a criação de 160.000 empregos verdes e sustentáveis até 2030. Relativamente à descarbonização do sistema energético europeu referiu que em dezembro deste ano é esperada uma proposta da comissão para legislar a descarbonização das redes de gás natural. Terminou salientando que a Europa pretende impulsionar e liderar a ação climática a nível mundial, apoiando financeiramente vários países e regiões para atingirem os seus objetivos climáticos no âmbito do Instrumento de Vizinhança, de Cooperação para o Desenvolvimento e de Cooperação Internacional.
Na opinião da Presidente do LNEG, Teresa Ponce Leão os maiores desafios que o mundo enfrenta atualmente, as catástrofes climáticas e a pandemia global, estavam previstas cientificamente, mas nenhuma ação preventiva foi considerada para minimizar os eventuais riscos e agora é tempo de agir e refletir sobre os ensinamentos que essas crises trouxeram. Refere também que a recuperação da situação pandémica deve ser uma oportunidade para recentrar o desenvolvimento do setor da energia em 6 pilares: a circularidade, a eletrificação renovável dos consumos, a integração de gases renováveis no setor energético, o papel ativo do consumidor, a integração de infraestruturas para produção de hidrogénio verde e a digitalização. Aponta que é necessário desafiar o status quo e implementar o conceito de circularidade em toda a cadeia de valor do setor energético. Foca, ainda vários desafios geopolíticos que envolvem a União Europeia, como a subida dos preços de eletricidade nos mercados diários, a dificuldade da China em obter matérias-primas para satisfazer a produção interna e acrescenta o resultado do The Circularity Gap Report que indica que estamos a reciclar apenas 8% dos nossos desperdícios. Para concluir salienta que, no futuro, é fundamental a integração dos diferentes recursos renováveis no sistema energético e que são necessárias alterações na regulação e exploração de novos serviços para acomodar uma transição energética inclusiva e justa.
Jorge Moreira da Silva inicia a sua exposição deixando um alerta para a necessidade de tratar o tema da transição energética de forma holística dado que existem diferenças significativas entre países quanto aos seus recursos endógenos e económicos. Refere que atualmente existe um consenso global relativo à necessidade de incrementar os esforços na cooperação internacional para combater os efeitos das alterações climáticas e salienta a enorme oportunidade que a descarbonização introduz na sociedade para, de forma sustentável, criar riqueza social e económica. Ainda assim, destaca 3 grandes ameaças no combate às alterações climáticas:
i) a inconsistência entre o compromisso que os países assinaram referindo-se à inconsistência entre o compromisso que os países assinaram nesse acordo e os reais resultados que se verificam, uma vez que atualmente já ultrapassamos o aumento de temperatura média do planeta em 1.2º C;
ii) a escala temporal dos planos de neutralidade carbónica, que apontam para 2050 a sua total concretização, data que, na sua opinião é desajustada e uma resposta tardia face à gravidade do problema que enfrentamos;
iii) o risco de os países em vias de desenvolvimento não acompanharem a transição energética por enfrentarem, ainda, desafios de cariz social e económico como a pobreza extrema, com 1.000 milhões de pessoas sem acesso a eletricidade em países muito afetados pelas alterações climáticas.
Numa perspetiva de recuperação social e económica pós pandemia e com o alinhamento do desafio de lutar contra as desigualdades e as alterações climáticas, destaca o enorme potencial na criação de emprego e oportunidades de crescimento sustentável da economia. Declara que o acordo de Paris é a última oportunidade para enfrentar a mudança climática, relembrando que até 2030, é necessário capacitar o mundo com 4x mais renováveis, 18x mais veículos elétricos e mais 4%/ano de investimento em eficiência energética. Sugere uma revisão das metas estabelecidas no acordo de Paris com metas mais ambiciosas, propondo abolir os subsídios aos combustíveis fosseis, massificar a mobilidade elétrica e investir massivamente na eficiência energética em edifícios. Termina a sua intervenção com uma breve nota sobre o investimento e financiamento que Portugal pode, e deve, captar para desenvolver o sector da energia com uma visão industrial, referindo que é necessário o aumento da capacidade das interligações ibéricas, para que a exportação de energia solar e eólica para o centro da Europa seja uma realidade, atraindo investimento e ajudando esses países a descarbonizar a sua economia.
Na Sessão de Encerramento o Presidente da Direção da Associação Portuguesa da Energia, Jorge Cruz Morais, afirmou: «Esta sessão centra-se num desafio verdadeiramente global no sentido em que muitas ações terão de ser implementadas localmente e desenvolvidas transversalmente em todas as geografias, considerando naturalmente o contexto específico de cada situação. Estamos num processo em que dependemos todos de todos, um processo sem uma liderança conhecida e que se desenvolve graças à consciência do problema que enfrentamos, ao sentido de urgência e á disponibilidade de recursos de cada país e cada região. Neste processo, acredito que a liderança se faz pelo exemplo, o papel da Europa, dos Estados Unidos e genericamente os países da OCDE será determinante no acelerar deste processo. […] Também s transição energética prossupõe apoio e solidariedade entre países e regiões, a contrapartida será o bem comum e um enorme conjunto de novas oportunidades de desenvolvimento económico, social e ambiental.»